Quase metade dos brasileiros (46%) afirma que não tomaria uma vacina contra a Covid-19 de origem chinesa. A rejeição a um imunizante chinês é maior do que de origem russa, rejeitada por 38% dos entrevistados, de Oxford (Reino Unido) ou dos EUA e Alemanha, ambos com rejeição de 22%. O Brasil já registrou 5,1 milhões de casos da doença e mais de 150 mil mortes.
É o que mostra uma pesquisa realizada pelo Instituto Realtime Big Data, encomendada pela CNN Brasil. Foram entrevistadas 1 mil pessoas por telefone nos dias 13 e 14 de outubro. A margem de erro é de três pontos (para mais ou para menos) e o nível de confiança é de 95%. Isto significa que se a mesma pesquisa fosse feita 100 vezes, o resultado seria o mesmo, dentro da margem de erro, em 95.
No Brasil estão em teste as seguintes vacinas: a da farmacêutica chinesa Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan, a da Universidade de Oxford/AstraZeneca (Reino Unido), a da Pfizer/BioNtech (EUA e Alemanha) e a da Johnson & Johnson/Janssen (Bélgica) – esta última teve o teste pausado nesta semana, após um participante adoecer.
A pergunta feita pelo instituto não citou o nome das vacinas ou fabricantes, mas somente o dos países envolvidos, da seguinte forma: “Você tomaria a vacina da China?” (e em seguida da Rússia, de Oxford e dos EUA/Alemanha).
A aceitação à origem das vacinas oscilou de acordo com a faixa etária dos entrevistados e outras características como gênero e região. No caso da China, por exemplo, a rejeição é menor entre 16 e 24 anos (37%) e maior entre os que têm 49 e 59 anos (56%).
Também há diferenças sobre gênero. Nas respostas sobre a Rússia, homens (43%) rejeitaram mais o imunizante do que mulheres (33%).
A maior rejeição a uma vacina vinda dos EUA e Alemanha é na região sul do país (33%), ante 23% no nordeste, 21% no sudeste e 16% no norte.
Apesar da rejeição, os números mostram que pelo menos metade da população estaria disposta a tomar qualquer uma das vacinas mencionadas, independentemente do país de origem. A Sinovac, de origem chinesa, teve resultados positivos em uma pesquisa com 50 mil voluntários na China, segundo o governo de São Paulo. De acordo com o governo paulista, a vacina é segura e não apresentou reações adversas significativas. Nos estudos clínicos que estão sendo feitos no Brasil desde o dia 21 de julho, também não foi registrada reação adversa grave.
As vacinas, ainda em fase de testes, são a maior esperança para conter o coronavírus no país e no mundo. No início de setembro, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que “ninguém é obrigado a tomar vacina”, mas uma lei sancionada por ele mesmo em fevereiro estabelece a determinação de realização compulsória de vacinação e outras medidas profiláticas “para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus”.
Além desta, há várias legislações que estabelecem vacinação obrigatória. No Brasil, a vacinação compulsória de crianças e adultos pode ser determinada pelas autoridades sanitárias e cabe ao Ministério da Saúde determinar quais vacinas são ou não obrigatórias em cada região do país e para circulação no território.
Desinformação pode matar
Para o virologista Rômulo Neris, doutorando em imunologia e inflamação na Universidade Federal do Rio de Janeiro, a rejeição da população tem a ver, inicialmente, com duas grandes causas: a geração atual cresceu em um ambiente em que as vacinas já controlam doenças graves há décadas. “Muitas doenças que nos afetaram por muito tempo já foram controladas e hoje o peso dessas doenças, prevenidas por meio de vacinas, é menor”. A outra é a proliferação de informações falsas na área da saúde.
“As fake news associadas à saúde acabam contribuindo para a formação de uma opinião pública que não é cientificamente embasada. É um risco muito grande, porque esse tipo de desinformação é capaz de não só causar danos à sociedade, mas também matar. Não há nenhum indício de que vacinas possam apresentar malefícios a longo prazo.”
O especialista ressalta que o método da vacina chinesa Sinovac é um dos mais antigos que existe, que consiste em injetar vírus inativados por agentes químicos ou físicos no organismo, fazendo com que o sistema imunológico identifique o invasor e produza defesas contra ele. Mesmo método usado em vacinas como a da gripe, por exemplo.
“Essa tendência de opinião pode ter a ver com a ideia de que a China foi colocada em descrédito por líderes como o presidente dos EUA Donald Trump, que responsabiliza o país pela pandemia. Acham que o vírus veio de lá e, portanto, a vacina não seria confiável. Por isso é importante ressaltar que é praticamente impossível saber de onde o vírus vai surgir. E também que não existe tecnologia para fabricar um vírus em laboratório que tenha esse grau de especificidade da doença. Esse vírus já circula em animais há muitos anos.”