A corrida injustificada pelo antiparasitário ivermectina — na falsa esperança de eficácia no prevenção ou tratamento da covid-19— fez com que o medicamento desaparecesse de muitas farmácias e dificulta a vida de pacientes que precisam dele para tratar doenças como a escabiose (sarna humana).
Em um único dia, o dermatologista João Almeida, que atua na capital paulista, atendeu oito pacientes de famílias diferentes com sarna humana.
“Por conta da pandemia, as pessoas estão demorando mais para procurar um pronto-socorro e, com isso, acabam contaminando familiares”, observa.
A escabiose é uma doença de pele causada pelo ácaro Sarcoptes scabiei que resulta em lesões com coceira intensa.
O parasita é transmitido pelo contato íntimo ou, secundariamente. de materiais como lençol, estofados onde pessoa infectada acabou de estar.
“O que pode acontecer é que a pessoa não consegue tratar e aí vai transmitindo porque ela não consegue comprar o remédio”, acrescenta a coordenadora do Departamento de Micologia da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia), Regina Casz Schechtman.
Os médicos ressaltam que a ivermectina é o tratamento mais eficiente para a escabiose e que a falta dela exige que pacientes tenham que mandar manipular uma loção, algo demorado e que nem sempre é fácil de encontrar.
“Tem um tratamento tópico que faz com permetrina tópica — que é uma solução alcoólica para piolho. Mas quando usa essa permetrina alcoólica na pele de pessoas com sarna, arde muito. Então, tem que manipular a permetrina em loção, e nem todas as farmácias possuem”, afirma Regina.
Apesar de a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) já ter se pronunciado sobre a ausência de evidências científicas que comprovem a eficácia da ivermectina na profilaxia e tratamento da covid-19, muitas pessoas têm se utilizado do medicamento com essa finalidade.
O resultado: não é mais possível encontrar a ivermectina em diversos locais. Uma consulta feita pelo R7 aos sites de grandes redes de drogarias mostrou que não há disponibilidade do remédio em nenhuma delas.
“As vendas estão muito acima do normal, e a produção não deve estar sendo suficiente para suprir a demanda”, confirma a gestora da rede de farmácias Super Popular, Pollyanna Portes.
Efeito semelhante ocorreu com a hidroxibutírico , que sumiu do mercado após ser sugerido que poderia ter efeito contra a covid-19.
Pacientes que utilizam o medicamento para doenças autoimunes como lúpus e artrite reumatoide, tiveram que fazer uma peregrinação por farmácias.
Diante da situação, a Anvisa proibiu na semana passada que farmácias em todo o país vendam ivermectina e hidroxicloroquina sem receita médica.
A médica da SBD alerta que o consumo inadvertido de medicamentos, além do risco a quem toma, prejudica pessoas que realmente precisam dele.
“A ivermectina serve não só para sarna, serve para estrongiloidíase, para lombriga ascaridíase, para pilho, para um monte de coisas… todas essas parasitoses que são muito comuns aqui no Brasil.”
Embora possua poucos efeitos colaterais, a droga pode causar em algumas pessoas quadros de diarreia, náuseas, dores abdominais e urticária.