Os procuradores do município de Rio Branco, Raquel Eline Albuquerque e Pascal Khalil tiveram um artigo, escrito em conjunto, publicado pela Frente Nacional de Prefeitos (FNP) e lançado na última quinta-feira, 12. A cartilha ‘Pagamento de Precatórios: alternativas e desafios’ reúne instrumentos legais para pagamento de precatórios utilizados pelos municípios brasileiros e foi apresentado durante o IV Encontro Nacional de Precatórios, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília.
O texto dos procuradores da capital acreana tem o tema ‘Financiamento Privado de Precatórios’ e é resultado do Seminário de Precatórios – Alternativas de Pagamento, promovido pela FNP, em agosto deste ano, que evidenciou a preocupação e disposição de prefeitos em honrarem essas dívidas.
Veja o artigo:
Financiamento Privado de Precatórios
Por Raquel Eline da Silva Albuquerque, procuradora-geral do município de Rio Branco, e Pascal Abou Khalil, procurador do município de Rio Branco
Há cerca de 10 anos a jornada dos precatórios teria, na literatura, paralelo com a jornada ao Inferno de Dante, com passagem obrigatória no purgatório das almas. Isso começou a mudar com o advento da Emenda Constitucional nº 62 que, pelo acerto do processo político de sua elaboração e pelo mérito da proposta, “pegou”, por assim dizer. Mas a aparente calmaria foi interrompida pelo julgamento das ADI’s 4425 e 4357 pelo STF.
A decisão, basicamente, declarou inconstitucional a EC 62 sob o argumento de que propunha um “calote”, afinal, permitia que os Entes devedores quitassem o seu estoque de dívida com precatórios até 2024 (15 anos da promulgação da EC 62). Então, adveio a EC 94 (15 de dezembro de 2016) e, antes de seu aniversário, a EC 99 (14 de dezembro de 2017). Esta última, que é a que nos interessa, trouxe novidades importantes, entre as quais a possibilidade de utilização de depósitos recursais e a contratação de empréstimo para pagamento de precatórios. Apenas para constar: definiu 2024 como prazo máximo para quitação do estoque, o mesmo prazo que o STF havia reputado como sendo “calote” oficial. Sobre isso, todavia, passou a vigorar um velado “acordo de cavalheiros”, pelo qual não se deve falar do assunto.
Com relação aos instrumentos adicionais introduzidos pela EC 94 e mantidos pela EC 99 – utilização dos recursos financeiros dos depósitos recursais e obtenção de empréstimo – vale observar que partem da lógica de que dívidas contextualmente muito elevadas, para serem pagas, demandam mais recursos ou mais prazo. Ambos os instrumentos traduzem essa lógica, com a diferença de que, no caso dos recursos dos depósitos recursais, não se tem a segurança desse “alongamento”, não sendo impossível que, por um acidente de percurso (ex: julgamento de uma ação de valor muito elevado, obrigando a devolução inesperada dos recursos do depósito recursal utilizados), venha a resultar em “encurtamento” do prazo.
O empréstimo, por sua vez, possibilita saber exatamente os termos em que será pago, permitindo à Administração planejar seu orçamento. Alonga-se a dívida pública – substituindo a dívida com precatórios com a dívida do empréstimo –, antecipa-se o pagamento aos credores e preserva-se a capacidade de oferta dos serviços públicos.
Servidor público que era, nosso sábio poeta já sabia que haveria pedras no caminho. E há. A promessa da linha crédito a ser oferecida pela União, prevista no § 4º do art. 101 do ADCT, não se cumpriu. Restou aos Entes buscar, por meios próprios, alguém disposto a lhes emprestar a uma taxa que seja, a um só tempo, atrativa a ambos.
A equação dos empréstimos, como se sabe, entre tantas outras, sempre tem duas variáveis presentes e proporcionais: risco e taxa de remuneração. Ao contrário do que se poderia supor, o risco dessa operação é baixo, por mérito da EC 99, que autorizou que se oferecesse como garantia a vinculação da receita do Ente.
Boas Práticas
Nesse contexto, o Município de Rio Branco obteve, junto à Caixa, operação de crédito para pagamento de cerca de 40% de seu estoque de precatórios vencidos, com taxa de 141,23% do CDI e prazo de 12 anos, com carência nos 2 primeiros. Infelizmente, não se tem notícia de operação semelhante Brasil afora, provavelmente em razão da percepção de que não há suficiente segurança jurídica. Este, portanto, é o principal desafio a vencer.
A problemática dos precatórios não está dissociada, obviamente, da questão do desequilíbrio fiscal pela qual atravessam as Administrações Públicas em geral, mas resolvê-la, ainda que não leve diretamente ao Paraíso de Dante, aliviará o peso dessa dura caminhada.