Acreanos se planejaram, em média, 1 ano para fazer intercâmbio e gastaram até R$ 10 mil. Agências de intercâmbio afirmam que número de pessoas que buscam experiência no exterior aumentou cerca de 60%.
Segurança, preços acessíveis, medo de ursos ao acampar em montanhas e até fazer uma entrevista de emprego sem entender a metade das perguntas, mas ainda assim ser contratado. Essas são algumas das experiências relatadas por acreanos que decidiram fazer intercâmbio no Estados Unidos, na América do Norte, e na Irlanda, Europa.
Três agências de intercâmbio em Rio Branco afirmaram um aumento no número de vendas de pacotes para intercâmbio. Uma das empresas diz que o crescimento foi de 60% de 2016 para 2017. No entanto, afirma que não tem essa proporção em números inteiros.
Ao G1, os acreanos João Paulo Maia, de 24 anos, que atualmente mora em Dublin, capital da Irlanda, e Daiane Pereira, de 23 anos, que mora em Burlington, no estado de Vermont, nos EUA, relataram os momentos inusitados, curiosidades e explicaram como se planejaram para realizar o sonho de aprimorar o inglês e conhecer outros países.
Maia relata que trabalhou em algumas coberturas jornalísticas no Brasil e decidiu que estava na hora de melhorar o inglês. A vontade de fazer o intercâmbio surgiu logo em seguida e ele decidiu ir para o exterior em 2016.
Quando viajou ele havia feito curso de inglês por um ano em uma escola de idiomas em Rio Branco, mas diz que não era fluente.
O planejamento, segundo ele, durou cerca de um ano em que ele guardava uma parte do salário e pagava o intercâmbio aos poucos. Maia conta que a agência que ele procurou tem sede em todas as capitais do Brasil e também em Dublin, o que transmitiu confiança a ele.
“Inicialmente, minha ideia era ir para Londres. Mas, na época, o valor estava acima do que eu imaginava para um intercâmbio. Foi aí que a consultora indicou Dublin. Pesquisei um pouco sobre a cidade, gostei e fechei”, lembra.
O processo para pagar o intercâmbio de Daiane foi um pouco diferente. Ela estava no segundo ano da faculdade, em 2013, e decidiu que faria a viagem quando terminasse o curso. Ela procurou o curso de inglês oferecido gratuitamente pelo Centro de Linguas (CEL), em Rio Branco, onde estudou por quatro anos e viajou falando inglês intermediário.
“Eu sempre tive um interesse a mais em vir para os Estados Unidos, mas também pesquisei outros países como Irlanda, França e Bélgica. Acabei optando pelos Estados Unidos que foi de onde tive mais informações”, explica.
Antes de contratar uma agência, Daiane tentou fazer a viagem para o exterior pelo programa Jovens Embaixadores e programas de bolsas na faculdade, mas não conseguiu. As informações sobre o intercâmbio para os EUA foram encontradas na internet.
“Meu planejamento começou buscando mais informações com pessoas que já fizeram o intercâmbio através das redes sociais, blogs, vlogs e entrando em contato com as agências. Comecei a economizar a partir daí”, conta.
O problema é que o único recurso da estudante na época era uma bolsa de estágio. Assim, ela procurou outros meios para complementar a renda e chegou a ter três empregos para juntar dinheiro o suficiente para fazer os pagamentos. Somente quatro meses antes de embarcar ela conseguiu um emprego com carteira assinada.
“Além do estágio remunerado, fazia extra trabalhando como recepcionista e auxiliar em uma empresa de cerimonial de eventos e também como caixa. Meus amigos me chamavam de ‘Julios’ [personagem da série Todo Mundo Odeia o Chris] porque eu tinha ‘três empregos’ e sempre estava procurando outros empregos”, relata.
Visto
Maia explica que o processo de visto na Irlanda é diferente em relação aos EUA e Canadá, por exemplo. O acreano explica que o intercambista entra no país como turista, mas, é claro, com a escola paga e toda a documentação em mãos e só tira o visto de estudante depois que estiver no país.
No entanto, para tirar o visto é necessário comprovar 3 mil euros e esse foi todo o dinheiro que ele levou inicialmente para o país.
“Nas duas primeiras semanas fiquei na acomodação da agência e nesse período encontrei uma vaga em um apartamento. Já mudei de casa três vezes e hoje estou morando em um apartamento no Centro com mais sete pessoas de diferentes nacionalidades (Brasil, Irlanda, México e Itália)”, conta.
Já Daiane disse que enfrentou um processo bem corrido para tirar o visto e lembra que não podia largar o emprego sem saber se a documentação dela seria aprovada. Ela lembra que precisou pagar hospedagem em hostel, passagens aéreas e alimentação na cidade de São Paulo para dar entrada no visto.
Somente com essas passagens ela gastou R$ 1.850. Ela conta que não somou todos os gastos, mas relata que começou a comprar dólares para pagar o intercâmbio com um ano e meio de antecedência. Quase todo mês a jovem gastava cerca 800 reais comprando dólares.
Com o processo todo, como o pacote de intercâmbio, seguro saúde, exames, passagens aéreas, hospedagens em SP entre outros custos, a jovem gastou R$ 10 mil.
“Esse intercâmbio que paguei é um dos mais baratos que encontrei. Só saiu muito caro para mim porque tive que viajar várias vezes para SP para todos os processos. E, sabemos como é absurdo e caro passagens áreas saindo do nosso estado”, lamenta.
Trabalho
Maia conseguiu um emprego no primeiro mês na Irlanda e desde então continua trabalhando. No entanto, ele destaca que os estudantes no país só podem trabalhar 20 horas por semana.
O jovem lembra que não entendeu metade das perguntas na primeira entrevista de emprego para limpar uma escola, mas foi contratado mesmo assim.
“Não é na minha área, mas são empregos que você consegue se manter e viver bem. Para o jornalismo é complicado conseguir um visto de trabalho, mas há áreas em alta por aqui, como de Tecnologia da Informação (TI). Se a empresa te contratar, ela que precisa pagar o seu stamp (visto)”, explica.
O acreano trabalha como barista, mas relata que já também trabalhou um pub e em restaurante como “kitchen porter”, lavando louça e ajudando os chefs de cozinha. Maia afirma que não tem vergonha de contar os locais nos quais atuou e afirma que tudo é um processo de aprendizado.
“Todas essas experiências me fizeram crescer como pessoa, ver o outro lado da vida, experimentar coisas novas e conhecer pessoas de diferentes continentes. Isso não tem dinheiro que pague. Hoje trabalho como barista em um café, testo meus limites diariamente e continuo num processo de aprendizagem que eu sei que nunca terá fim”, destaca.
Daiane optou por ficar na casa de uma família americana onde ela trabalha em troca de um pequeno salário, moradia e alimentação.
“Eu trabalho. Visto de trabalho é complicado e muito difícil de conseguir. Se você faz um intercâmbio seu visto é de intercambista que permite que você trabalhe em determinada coisa e estude”, diz.
Pontos positivos
Entre pontos positivos do exterior, segundo Maia, estão a segurança, já que nem mesmo os policiais usam armas, os preços acessíveis de vestimentas e passagens baratas para conhecer outros países. O jovem diz que desde que foi morar em Dublin já visitou oito países passando por mais de 15 cidades.
“Fui para Londres assistir o jogo do Brasil x Inglaterra, por exemplo, e paguei 30 euros de passagens (ida e volta). Os preços das roupas e do mercado também são inacreditáveis para quem mora no Brasil. Mas aqui não são só coisas boas, tem muito lixo nas ruas e muito homeless (pessoas dormindo nas ruas)”, relata.
Já a intercambista acreana conta uma situação inusitada no primeiro acampamento dela em uma montanha nos EUA, o que segundo ela é bem comum no país. A jovem conta que ao chegar no local se deparou com várias placas de alerta de urso e passo o acampamento inteiro com medo.
“Eu e minhas amigas quase não conseguimos dormir à noite pensando que qualquer barulho poderia ser um urso se aproximando. Uma coisa interessante da cultura americana e característica do povo do estado em que vivo é que eles são muito humanitários e simpáticos, sempre cumprimentam na rua, sempre muito solícitos e cordiais”, afirma.
A jovem também destaca as estações do ano que são bem definidas nos EUA e destaca se apaixonou pelo outono.
“O inverno é neve e mais neve, primavera é a volta das roupas leves. O verão é o mais desejável e todos querem sair e aproveitar o sol. O outono aqui é a coisa mais linda que já vi, as árvores coloridas são a cereja do bolo de tão charmosas”, relata.
Transporte
Daiane pretende ficar nos EUA por um ano, enquanto Maia diz não saber quanto tempo vai permanecer na Irlanda.
O acreano detalha a rotina dele em Dublin, que inclui a escola de inglês de segunda a sexta e trabalho à tarde nos dias em que está escalado. Depois disso segue para a academia, mercado e, às vezes, sai com amigos ou faz algo em casa.
“Como moro no Centro, faço quase tudo a pé. Só o trabalho que é longe, 50 minutos de Luas, trem de superfície que tem em Dublin”, explica Maia.
Daiane explica que também mora em uma região central e geralmente vai aos locais a pé. “Eu moro a poucas quadras do centro da cidade aqui, então é bem mais fácil andar, quando quero ir para um local mais longe eu faço uso de bicicleta, carro, ônibus e táxi”, conta.
Imersão
Os dois acreanos indicam o intercâmbio para quem quer aprimorar um novo idioma. Daiane lembra que mesmo após fazer o curso de inglês não se sentia preparada e segura para conversar em outra língua por medo de errar.
A acreana afirma que o intercâmbio a fez amadurecer e sair da zona de conforto. Para quem também deseja ter a experiência ela indica planejamento, pesquisa e estudo.
“O intercâmbio não é bom somente para aperfeiçoar a língua que você quer aprender, ele ensina você para a vida. Estou aqui há quatro meses e sinto que amadureci 4 anos a mais. Você sair de casa, do conforto da casa dos seus pais, da sua língua, da sua cultura, somado com a distância é muito difícil, mas sei que tudo isso vai valer em algo para a minha vida”, afirma.