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Índios que viviam isolados vão para capital do AC fugindo da fome e de madeireiros peruanos

Outro motivo relatado por eles é o atrito com a Funai. ‘Não entendo o que a Funai fala’, diz. Aldeia isolada fica a quatro horas de barco da cidade de Feijó, no interior do Acre.


Há cerca de seis meses, dois índios de recente contato da aldeia Xinane, conhecidos como Isolados do Alto Envira, na fronteira do estado do Acre com o Peru, estão morando em uma casa no bairro Cidade do Povo, região do Segundo Distrito de Rio Branco.


Eles não falam nem entendem nenhuma palavra em português e só depois de muita persistência, e com ajuda de intérpretes da etnia Jaminawa, o G1 conseguiu conversar com um deles, chamado de Curumim pelos moradores da casa.


De cabelos cortados ao estilo Neymar e usando uma camisa do Barcelona, ele afirma fugir da fome, do conflito com madeireiros peruanos e do atrito com a Fundação Nacional do Índio (Funai), que demitiu os intérpretes dificultando a comunicação entre eles. A reportagem procurou a Funai, mas até a publicação desta matéria não teve retorno.


A aldeia isolada onde os dois viviam fica a quatro horas de viagem de barco da cidade de Feijó, no interior do Acre. Os dois estão morando em um local improvisado na casa da índia Mariquinha Jaminawa, que vive na Cidade do Povo há cerca de três anos.


Curumim é um dos índios que aparecem fazendo contato em junho de 2014, com índios ashaninkas, na Aldeia Simpatia, da Terra Indígena Kampa e Isolados do Alto Rio Envira.


Curumin é um dos índios isolados que deixou aldeia no Alto Envira para viver em Rio Branco (Foto: Iryá Rodrigues/G1)

Curumin é um dos índios isolados que deixou aldeia no Alto Envira para viver em Rio Branco (Foto: Iryá Rodrigues/G1)


‘Se o pessoal da Funai sair de lá, eu volto’, diz

Ele conta que onde vivia, inicialmente, não tinha contato com ninguém, nem mesmo indígenas de outras etnias. Com o tempo, passaram a conhecer outros povos até a chegada da Fundação Nacional do Índio (Funai), na base Xinane.


A relação entre a Funai e os isolados complicou quando os intérpretes que faziam essa ponte foram demitidos, segundo ele.


Imagens dos índios isolados divulgadas pela Funai de contato feito em 2014 (Foto: Divulgação/Funai)

Imagens dos índios isolados divulgadas pela Funai de contato feito em 2014 (Foto: Divulgação/Funai)


“Quando morava dentro da mata, andava nu e não tinha nada. Depois a Funai conheceu lá e comecei a conhecer os brancos. Não vou voltar, porque não entendo o que a Funai fala. Só vou voltar se os intérpretes voltarem para lá. Se o pessoal da Funai sair de lá, eu volto”, conta o índio, que não sabe dizer quantos anos tem.


Sobre sentir saudade da família, Curumim diz que sempre pensa nos parentes. “Todo dia eu lembro da minha mãe, do meu pai, meu irmão e irmã. Todo dia estou lembrando deles lá”, diz.


O outro indígena que chegou em Rio Branco junto com Curumim, foi para Sena Madureira visitar outros parentes.


O índio diz que acha bom viver na cidade, apesar da diferença nos costumes. Com um corte de cabelo diferente do que fazia na aldeia, Curumin diz que prefere o novo visual.


“Tenho roupa agora. Lá eu não tinha e andava nu. Aqui é bom, corto meu cabelo como o de vocês e não mais como era lá”, fala com um sorriso.


Índios isolados moram na casa da índia Marquinha Jaminawa, na Cidade do Povo, em Rio Branco (Foto: Iryá Rodrigues/G1)

Índios isolados moram na casa da índia Marquinha Jaminawa, na Cidade do Povo, em Rio Branco (Foto: Iryá Rodrigues/G1)


‘Ajudo com o que posso’

Da etnia Jaminawa, a indígena Mariquinha fala a mesma língua dos dois isolados. Vivendo somente com o recurso do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), ela diz que ajuda os dois como pode e que se sente bem assim. Na casa da índia, vivem quatro pessoas.


“O que eu tiver aqui, posso comer com eles. Lavo a roupa deles. Por mim mesmo, está tudo bem. Ajudo como posso ajudar. Tem dia, quando recebo meu dinheiro, compro macaxeira para ele comer ou banana também”, diz Mariquinha.


Intérpretes desligados pela Funai

Um dos motivos para a saída dos índios isolados da aldeia é a falta dos intérpretes que faziam a ponte entre eles e a equipe da Funai. Eles contam que há cerca de oito meses foram desligados e desde então, os índios passaram a deixar a aldeia.


Um dos intérpretes que trabalhava no local, Lula Pereira Jaminawa, conta que começou a trabalhar na aldeia isolada desde 2014. Ele fala das dificuldades do trabalho e da situação após as demissões.


“Quando estávamos trabalhando lá, os parentes [índios isolados] viviam lá todos com a gente. Não tinham vontade de vir para a cidade. Depois, quando o coordenador da Funai tirou a gente de lá, os índios souberam que a gente não ia mais e por isso, começaram a sair. Sabiam onde a gente morava e vieram bater em Feijó”, conta o intérprete.


O motivo para a demissão dos cinco intérpretes seria a falta de recurso. “Eles não vão ficar lá. Acho que mais índios vão sair. Eles querem vir para a cidade, porque eles não entendem o pessoal da Sesai e Funai que estão lá”, explica


Índios isolados vivem em área improvisada na casa de indígena na Cidade do Povo (Foto: Iryá Rodrigues/G1)

Índios isolados vivem em área improvisada na casa de indígena na Cidade do Povo (Foto: Iryá Rodrigues/G1)


Fome e briga com madeireiros peruanos

Outro motivo para os índios isolados deixarem a aldeia, segundo o intérprete Edson Pereira Jaminawa, seria a fome e também o medo dos conflitos madeireiros peruanos. Segundo ele, existem ainda os casos de mortes entre os próprios indígenas da região.


Conforme o intérprete, ao menos 35 índios isolados, entre mulheres, homens e crianças deixaram a base Xinane. Hoje ainda tem pouco mais de 20 índios na aldeia.


“O primeiro contato foi muito perigoso. Eles pegavam flecha para nos matar. Eles viviam bem, não pensavam na cidade não. Mas, saíram de lá uns 35 e alegaram fome e briga com madeireiros peruanos. Os peruanos matavam um bocado deles e os próprios índios matavam eles. Por isso começaram a sair”, afirma o indígena.


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