Chefão da Telexfree chamava divulgadores de “povo burro”

Era por meio de vídeos no Youtube que o dono da Telexfree, Carlos Costa, sempre aparecia para rebater as acusações de que a empresa seria pirâmide financeira e para garantir estar preocupado com a liberação do dinheiro dos divulgadores. De tempos em tempos, lá estava ele tentando passar tranquilidade e confiança a quem havia investido na empresa . Porém, nos bastidores, o discurso era outro e envolvia até ofensas aos associados. Em conversas com o sócio Carlos Wanzeler, o empresário zombava dos investidores, chamando-os de “povo burro”.


As conversas fazem parte das oito denúncias apresentadas no último mês pelo Ministério Público Federal à Justiça Federal no Espírito Santo. As provas das irregularidades, coletadas durante a Operação Orion em 2014, foram retiradas do sigilo pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região.


Em várias mensagens, Costa e Wanzeler discutiam sobre o percentual de divulgadores que não pediam resgaste das remunerações conquistadas com o negócio e comemoravam o alto índice de reinvestimento na empresa.


Os dois também conversaram sobre estratégias para mostrar legalidade no negócio. Uma das armas, segundo Costa, seria pagar impostos. “Isso seria como investimento para manter o negócio… pois provamos com impostos que temos clientes seja onde for no mundo…”, escreveu Costa para Wanzeler em janeiro de 2013 assim que veio à tona as investigações envolvendo a empresa.


As atividades da Telexfree foram suspensas, a princípio, de forma liminar em junho de 2013 pela Justiça do Acre. Todos os bens dos sócios da companhia e de familiares, cerca de R$ 700 milhões em dinheiro, além de imóveis e carros, foram bloqueados.


De acordo com a denúncia do MPF, para continuar a captar recursos de investidores e manter altos lucros, os empresários burlaram essa decisão judicial, cadastrando novos associados, residentes no Brasil, por uma susposta rede americana.


O caso foi revelado por A Gazeta e pelo Gazeta Online com a reportagem “Polícia Federal apura movimentação da Telexfree nos EUA”, publicada em 5 de setembro de 2013. Em troca de mensagens com Inocêncio Pereira Reis Neto, o Pelé, Carlos Costa mostrou preocupação em ter os planos frustrados após divulgação da matéria. “… parece que saiu na gaceta (sic) sim que líderes estariam fazendo rede no exterior… então muito cuidado no dia de hj (sic)”.


O braço americano da Telexfree atuou até 13 de abril de 2014, quando a empresa entrou com pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos. Outros diálogos dos empresários, no entanto, revelam que pelo menos um mês antes a empresa já não tinha mais condições de pagar os lucros conquistados pelos divulgadores.


Num bate-papo pelo Skype, no dia 7 de abril de 2014, Carlos Costa afirma para Wanzeler que mais de 70% reinvestiu os ganhos. “…pode confiar em mim nesse número. eles sempre fazem isso e vc (sic) sabe disso… se não for mais. kkkkk. povo burro. kkkkkk”.


Em setembro de 2015, a empresa foi condenada pela 2ª Vara Cível de Rio Branco a ressarcir os divulgadores devido à comprovação de que o negócio seria uma pirâmide financeira. Apesar da decisão do Acre, os donos da empresa e líderes de rede continuaram a ser investigados pela Polícia Federal no Espírito, que concluiu parte do inquérito criminal em janeiro.


Os empresários mais 20 pessoas são acusados de cometer crime contra o sistema financeiro ao fazer da Telexfree um banco clandestino que emitia moeda eletrônica e a transformava em dinheiro de verdade. Eles também foram denunciados por lavagem de dinheiro, por usar laranjas por ocultar bens e por organizar pirâmide financeira e vender valores mobiliários sem autorização da Comissão de Valores Mobiliários.


Pai e filha brigavam por causa de carro


Além de diálogos sobre as tramas envolvendo a empresa, a denúncia contra a Telexfree traz à tona também dramas familiares, como uma divergência entre Carlos Wanzeler e a filha delel, Lyvia Wanzeler.


Como os carros do empresário e de seus familiares envolvidos no susposto esquema estavam sequestrados pela Polícia Federal desde julho de 2014, Lyvia pedia o pai, de acordo com a acusação do MPF, para comprar para ela um carro de luxo em nome de terceiros.


Durante as conversas, Lyvia se mostra revoltada com o pai, que hesitava em adquirir um veículo que custa mais de R$ 200 mil, e dizia achar injusto que um dos advogados da Telexfree, Danny Fabrício Cabral Gomes, havia emprestado o nome dele para comprar um carro para a mulher do Carlos Costa, Jozelia Sangali.


A denúncia também revela que Carlos Costa, Carlos Wanzeler, Pelé Reis e parentes tinham caderninhos de anotações com uma contabilidade informal sobre o dinheiro que entrava na Telexfree por meio da emissão de bônus.


Segundo a Polícia Federal e o MPF, para gerenciar o negócio, a Telexfree tinha um programa chamado Back Office. O sistema era usado para cadastrar divulgadores e mantê-los informados sobre os “créditos” em dólar que arrecadavam com as atividades na empresa.


A Telexfree tinha no programa um mecanismo para criar “créditos manuais” para pagar bônus de divulgadores que não foram contabilizados por erro. No entanto, a partir de junho de 2013, quando as atividades da empresa foram suspensas no Brasil pela Justiça do Acre, os http://ecosdanoticia.net/wp-content/uploads/2023/02/carros-e1528290640439-1.jpgistradores do grupo começaram a usar essa brecha para emitir moeda eletrônica, ou seja, criar bônus em nome de líderes da empresa e dos donos. A ideia era usar esse recurso para continuar com a inscrição de divulgadores em território brasileiro ou em outros países, no que eles chamavam de rede internacional, burlando a decisão judicial.


Centenas em milhões em moeda eletrônica foram emitidas e transferidas a “líderes”. O dinheiro digital era criado artificialmente sem ligação com as atividades de recrutamento ou publicação de anúncios. Esse crédito, cotado em dólar, não existia fisicamente, ou seja, não havia valor equivalente a ele depositado em contas bancárias da empresa.


Defesa diz que fim do sigilo é inconstitucional


O advogado criminalista Rafael Lima, defesa do dono da Telexfree, e da maioria dos denunciados, diz que não vai comentar o teor dos diálogos dos empresários revelados nas denúncias do Ministério Público Federal.


Segundo ele, as conversas são de natureza íntima e deveriam ter sido mantidas em segrego pelo Judiciário. “ Qual seria o motivo de não se preservar esses dados sigilosos? As denúncias trazem conversas telemáticas, dados fiscais, bancários. Para que isso? Como isso pode contribuir com a sociedade. O juiz havia autorizado a publicação de parte das informações sobre a denúncia. O público já foi informado sobre o caso”, disse.


Para eles, as mensagens foram colocados no processo fora do contexto. “São trechos soltos. Uma frase. Seria bem diferente se fosse colocado dentro de um contexto”.


A publicidade do caso foi, inicialmente, negada pelo juiz substituto da 1ª Vara Federal de Vitória, Vitor Berger Coelho. Mas foi derrubada pelo desembargador Federal Paulo Espírito Santo no dia 14 de março, última terça-feira.


“É inconstitucional revelar essas conversas. O Interesse do MPF em ter recorrido da decisão é apenas para execração pública, para um pré-julgamento dos acusados. É uma forma de pressionar a Justiça com a opinião pública. Vamos recorrer dessa decisão”.


Para o desembargador, no entanto, “a publicidade externa, em particular, para os meios de comunicação e, no caso, às supostas vítimas dos acusados, deve prevalecer, pois o processo é, em regra, público. Conservar esses autos sob sigilo, com o argumento de que a intimidade, a honra e a moral dos denunciados devem ser preservadas, não merecem prosperar, eis que o interesse público à informação é a regra no direito pátrio, em especial no caso ora em análise, em que milhões de pessoas foram supostamente vitimadas, tendo, inclusive, conforme consta na inicial acusatória, perdido todas as suas economias, desfazendo-se de seus bens, iludidos com as promessas dos envolvidos, muitos acreditando que a “culpa”, na verdade, seria da Justiça que determinou o encerramento das atividades das empresas envolvidas.”


Sócio americano vai pegar 10 anos de cadeia


O sócio americano da Telexfree, o James Merrill, pode ficar 10 anos na cadeia. Após acordo de colaboração premiada com o empresário, os procuradores federais dos Estados Unidos recomendaram esse tempo de prisão para o ex-executivo, de acordo com reportagem do Boston Globe.


Merrill confessou ter participado de uma conspiração global ao promover uma pirâmide financeira. Ele se declarou culpado em outubro passado por diversas fraudes. Ele será condenado em tribunal federal em Worcester, Massachusetts, na próxima semana.


Nos documentos arquivados na última quinta-feira, os procuradores alegaram que, de fevereiro de 2012 a abril de 2014, a Merrill http://ecosdanoticia.net/wp-content/uploads/2023/02/carros-e1528290640439-1.jpgistrou as operações diárias da TelexFree, controlou suas contas bancárias e ajudou a projetar seu sistema de compensação.


Além de Merrill, Carlos Wanzeler, que fugiu dos EUA em abril de 2014 após as autoridades iniciaram uma investigação, também é um dos acusados.


Os promotores disseram que “não é exagero dizer que Merrill e co-réu Carlos Wanzeler destruíram a vida de milhares de pessoas em todo o mundo”.


Wanzeler fugiu daquele país, via Canadá. Os documentos afirmam que “Wanzeler desviou e lavou milhões de dólares dos cofres do Telexfree.”


Em janeiro, um homem com laços com Wanzeler foi preso depois que as principais autoridades chegaram a um apartamento em Westborough, onde US $ 17,5 milhões estavam escondidos na caixa de uma cama .


Merrill pediu desculpas no tribunal no outono passado por não alertar investidores mais cedo que Telexfree estava perto do colapso.


Confira os diálogos:


(as conversas estão reproduzidas aqui exatamente da forma que ocorreram, inclusive com erros de grafia)


10/01/2013


Conversa entre Carlos Costa e Carlos Wanzeler sobre como usar os impostos para construir uma imagem de legalidade do negócio. Para o MPF, mensagens mostram que empresários sabiam da ilegalidade da Telexfree.


Carlos Costa – digo que se pagassemos os impostos de venda, PRA SUSTENTAR NA NOSSA CONTA, ninguém pode fechar a gte, entendeu


Carlos Wanzeler – Sim


Carlos Costa – isso seria como investimento pra manter o negócio


Carlos Wanzeler – Isso aí


Carlos Costa – pois provamos com impostos que temos clientes seja onde for no mundo etc… no caso Brasil é o melhor lugar


Carlos Wanzeler – sim, temso que divulgar o que a empresa vendeu com os anuncios dos nossos clientes, mesmo que seja eles mesmo / mais para isso temos que ter um montante bom / 10.000.000 para cima / ai arrebentamos / por que ai provamos, que mesmo que todos parem, a empresa continua faturando 10.000.000 por mes / e isso que prova que não e piramide


25/03/2014


Conversa de Carlos Wanzeler com Carlos Costa sobre travas criadas no sistema para que os divulgadores fossem impedidos de pedir todos de uma só vez o resgate dos rendimentos com o negócio.


Carlos Wanzeler – Lembra da nossa trava / Seria bom colocarmos em 20 / O que acha


Carlos Costa – Show


02/04/2014


Mensagem de Carlos Wanzeler para Carlos Costa sobre a falta de recursos da Telexfree para pagar a todos os associados


Carlos Wanzeler – A unica solucao que temos e aumentar o recebimento em dinheiro e fazer eles gastarem com bonus, assim diminui a requisicao / Montar a estrategia em cima disso


07/04/2014


Conversa no Skype entre os sócios sobre o índice de reinvestimento dos divulgadores na rede da Telexfree. Carlos Costa, nesse diálogo, chama os divulgadores de “povo burro”.


Carlos Costa – mas temos mais de 70% de reinvestimento


Carlos Wanzeler – Com certeza


Carlos Costa – pode confiar em mim nesse número / eles sempre fazem isso / e vc sabe disso


Carlos Wanzeler – E o que penso também


Carlos Costa – se não for mais / kkkkk / povo burro / kkkkkk


06/09/2013


Conversa de Carlos Costa sobre reportagem do Gazeta Online que mostrava como pessoas ligadas à Telexfree estavam burlando a proibição de cadastramento emitida pela Justiça do Acre inscrevendo divulgadores na rede do exterior.


Carlos Costa – Pele / cade vc? / nao veio hj cedo / kkkkkk / aquí parece que saiu na gaceta sim que líderes estariam fazendo rede no exterior / entao muito cuidado no dia de hj ok, GRACAS A DEUS saiu hj / dia fraco de venda de jormnal e já vem o final de semana entao creio que nao terá muita coisa nao ok / mas hj é bom prevenir certinho blz


Pelé Reis – ok


ENTENDA O CASO


Quando começou – A Telexfree começou a operar em fevereiro de 2013.


Crescimento – Em 2013, o tamanho da empresa chamou a atenção das autoridades. A empresa começou a ser investigada pela Promotoria de Defesa do Consumidor do Acre e pela Polícia Federal no Espírito Santo.


Bloqueio – Em junho de 2013, a Justiça do Acre paralisou as atividades da empresa devido aos indícios de irregularidades.


Operação orion – O MPF e a Polícia Federal em julho de 2014 deflagraram a primeira fase da Operação Orion, apreendendo bens da empresa, sócios e líderes. Uma segunda fase ocorreu em outubro do mesmo ano, ampliando as investigações.


Sentença – Em setembro de 2015, a Justiça do Acre mandou a Telexfree devolver o dinheiro aos divulgadores, mas o ressarcimento não ocorreu porque os bens continuam sequestrados pela Justiça Federal no Espírito Santo.


Novas denúncias – Em fevereiro de 2017, o MPF apresentou à Justiça Federal no Espírito Santo oito denúncias contra, uma delas envolve 22 pessoas. Com informações gazetaonline


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