Um estudante do ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica), instituição de ensino superior ligada às Forças Armadas, participou da sua colação de grau vestido de mulher, em protesto contra perseguição que ele teria recebido por ser homossexual. Segundo ele, diversas punições o teriam forçado a se desligar da Aeronáutica no meio do curso.
A cerimônia de colação de grau dos formandos do ITA foi no último sábado, dia 17. Talles Oliveira Faria, 24, que se formou em engenharia, recebeu o diploma com um vestido rosa, salto alto e maquiagem. A roupa ainda trazia mensagens críticas ao ITA.
“A manifestação não foi só relacionada à homofobia, mas também à violência psicológica que ocorre aqui dentro”, disse Faria, que é homossexual e ativista contra a homofobia.
A decisão de comparecer vestido de mulher à colação foi motivada por uma série de punições que recebeu após outro protesto, em maio do ano passado, quando ele se vestiu de drag queen para marcar o Dia Mundial do Combate à Homofobia (17 de maio). Além de estudar no instituto, Faria seguia também como militar.
A manifestação ocorreu na hora do intervalo e reuniu outros colegas, com cartazes contra o preconceito. Além de ser punido por agredir “o decoro da classe, protagonizando cenas vulgares” por conta do episódio, Faria recebeu mais seis punições na sequência, algumas relacionadas a postagens em sua conta pessoal do Facebook.
Ele foi punido por “agredir símbolos religiosos”, por ter colocado na rede social críticas ao catolicismo na relação com a homossexualidade, e por ter publicado imagem “agressiva à bandeira do Brasil” -também na rede social.
A publicação trazia uma bandeira do Brasil com corações no lugar das estrelas e a frase “põe a cara no sol, mona”, no lugar do lema “ordem e progresso”. Outra punição ocorreu por causa de ato em apoio à ex-presidente Dilma Rousseff (PT), no ano passado, no intervalo das aulas.
Nos recursos encaminhado aos oficiais superiores, Faria anexou imagens de manifestações de outros estudantes, em apoio ao então candidato à presidência Aécio Neves (PSDB), e publicações de caráter político nas redes sociais feitas por integrantes da Aeronáutica. Segundo Faria, só ele foi punido.
Faria afirma que sua orientação sexual e sua militância provocou uma “perseguição” sistemática, efetivada por meio das punições -os chamados FATD (Formulários de Apuração de Transgressão Disciplinar). Pela quantidade de punições, o estudante teve que se desligar da carreira militar, pela qual recebia o salário de R$ 6 mil, para não ser expulso também da faculdade.
“Tive que deixar de ser militar porque só me deram essa alternativa. Ou pedia o desligamento da Aeronáutica, ou iam me expulsar do ITA e da FAB [Força Aérea Brasileira]”, diz.
O estudante afirma que chegou a pensar em entrar na Justiça contra a FAB sobre o episódio. O receio de ser desligado do ITA fez com que ele prosseguisse com as aulas até a formatura. “Sei da homofobia silenciosa, mas efetiva, no ITA e nas Forças Armadas”, diz ele, que não descarta uma ação judicial por conta do episódio. “Espero que as pessoas possam me ver e se sentir mais seguras nesse ambiente”.
A reportagem questionou a FAB e o ITA, mas até a publicação deste texto não havia resposta.
O ITA é uma das instituições de ensino superior mais renomadas e concorridas do país. Está ligada ao Comaer (Comando da Aeronáutica). A unidade fica no Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial, na cidade paulista de São José dos Campos.